Mitos e Liberdade segundo Sartre

PROFª Margarida Jansen ENSINO MÉDIO- Filosofia

I – LIBERDADE: ELA EXISTE?

Liberdade - essa palavra
Que o sonho humano alimenta

Que não há ninguém que explique,
E ninguém que não entenda!

Cecília Meireles. Romanceiro da Inconfidência.

1 – Determinismo

OS MITOS DE TÂNTALO, PÉLOPS E NÍOBE

Tântalo

Tântalo era um rei rico e famoso em Sípilo, além de ser um dos filhos de Zeus; como tal, era amigo dos deuses e sempre era convidado a comer na mesa deles, no Olimpo. Porém, vaidoso, Tântalo revelou segredos dos deuses aos mortais, roubou o néctar e a ambrosia dos deuses e entregou-os a seus amigos mortais, escondeu um cão de ouro em Creta e, para testar a onisciência dos deuses, cometeu um crime terrível: matou seu próprio filho, Pélops, serviu sua carne na refeição e esperava que os deuses comessem a carne humana.

Os deuses perceberam, ressuscitaram Pélops e castigaram Tântalo da seguinte forma: em um lago, ele ficou preso com o nível da água até o seu queixo, uma sede muito forte o incomodava, mas ao tentar beber a água, o nível dela abaixava e ele nunca conseguia bebê-la. Atrás de Tântalo, belíssimas árvores carregadas de frutas tinham galhos que chegavam sobre sua cabeça, quando ele movimentava-a para cima, um vento forte afastava os galhos cheios de frutas para longe, impossibilitando Tântalo de matar sua fome. Piorando seu sofrimento, ainda havia um rochedo suspenso no ar e localizado acima de sua cabeça, deixando-o com um terrível medo da morte.

Eis o destino de Tântalo por seu crime. Por mais que ele se esforçasse e tentasse em tomar água, esta afastava-se; por mais que ele se esforçasse em tentar comer as frutas, estas também se afastavam; por mais que ele tentasse esquecer do rochedo, ele estava bem acima de si. A sede, a fome e o medo sempre venciam – o destino mostrava-se imutável: era impossível alterar a decisão dos deuses olímpicos.

A vida de Tântalo estava determinada, controlada pelos deuses. Em Filosofia, denominamos de determinismo a idéia de que somos controlados por algo ou alguém, a idéia de que temos um destino, de que ele seja inalterável e que possa estar escrito independentemente de nossa vontade. Tudo o que acontece conosco pode estar previamente definido.

Pélops

Esta idéia de que nossa vida pode estar traçada anteriormente por algo ou alguém, é vista com mais clareza na continuidade do mito: Pélops era o filho de Tântalo, morto por seu pai e ressuscitado pelos deuses, ele apaixonou-se pela princesa Hipodâmia, de Elice. O rei Enômao ouvira de um oráculo que se sua filha se casasse, ele morreria. Para evitar o casamento de sua filha, o rei anunciava uma corrida de carruagem a todos os pretendentes dela: a corrida acontecia de Pisa até o altar de Poseidon, em Corinto, e enquanto os pretendentes largavam na frente, o rei oferecia um carneiro a Zeus. Se o rei alcançasse seu oponente, podia matá-lo com sua lança; caso contrário, o pretendente poderia casar-se com Hipodâmia – assim, muitos já haviam morrido, já que os cavalos do rei, Fila e Harpina, corriam mais velozmente que o vento Norte.

Pélops era mais um concorrente e, antes da corrida, invocou Poseidon, que o atendeu e ofereceu a ele uma carruagem com cavalos alados e rápidos como flechas. Na corrida, mesmo com estes cavalos, Pélops foi alcançado por Enômao. Poseidon soltou as rodas da carruagem do rei, que caiu e morreu enquanto Pélops alcançava a linha de chegada em Corinto. De volta a Pisa, Pélops ainda salvou a princesa de um incêndio do castelo real e, enfim, casou-se com sua amada.

Dizíamos que a idéia de determinismo aparece nesta narrativa mais claramente que na primeira. Basta verificar que a previsão oracular cumpriu-se com todo o seu rigor: como perdeu a corrida, o rei seria morto e, no momento que ele cai da carruagem, a morte apresentou-se fatalmente, tal como estava determinado. No derminismo, não há como alterar o destino imposto pelos deuses: uma vez que o destino do rei era a morte, caso sua filha se casasse, ela mostrou-se fatal, inexorável.

Níobe

Níobe era orgulhosa como seu pai, Tântalo. Como rainha de Tebas, certa vez proibiu as pessoas de fazerem uma homenagem a Leto, Apolo e Ártemis alegando que ela é que deveria ser homenageada por ser filha de Tântalo, neta de Zeus e um de seus antepassados é Atlas. As oferendas foram interrompidas e todos voltaram para casa.

Leto, a deusa do destino, e seus filhos, Apolo e Ártemis, reagiram aos insultos de Níobe e prepararam uma terrível vingança: Apolo acertou, com flechas, cada um dos sete filhos de Níobe, que faziam treinos eqüestres. A notícia se espalhou e Anfíon, rei de Tebas e marido de Níobe, ao saber da notícia, suicidou-se com sua espada. Níobe, acompanhada de suas sete filhas, correu para o campo lamentando a morte de seu marido e de seus filhos; porém, continuou a gritar contra os deuses e considerando-se mais rica. Assim, novas flechas voaram em Tebas e mataram também as suas sete filhas. Sentada diante de seus sete filhos, sete filhas e marido, todos mortos, Níobe ficou paralisada de tanta dor, o vento já não conseguia fazer seus cabelos oscilarem, o sangue petrificou em suas veias: Níobe foi transformada em uma rocha, mas que ainda continuava a chorar. Por fim, uma ventania jogou a pedra pelos ares e a levou até a Lídia, onde Níobe está até hoje em uma montanha, chorando. A deusa do destino vingou-se furiosamente do orgulho de Níobe e sua tentativa de interromper o louvor aos deuses.

Os três mitos acima expressaram algumas características fundamentais da idéia de determininsmo:

- nossa vida é controlada por algo ou alguém, tal como Tântalo controlado pelos deuses no lago;

- não há como alterar o nosso destino, tal como o rei Enômao que não escapou da morte assim que Pélops venceu a corrida de carruagem.

VAMOS FILOSOFAR

1 – Procure no dicionário o significado das palavras abaixo e transcreva-os para cá.

a) destino


b) determinismo

2 – Qual foi o crime cometido por Tântalo? Qual foi o seu destino imposto pelos deuses como castigo?


3 – Qual era a previsão oracular que o rei Enômao conhecia? O que ele fazia para tentar impedi-la? Como a previsão oracular realizou-se no mito de Pélops?

4 – Como Níobe insultou os deuses? Como estes reagiram? Qual foi o destino imposto a ela como castigo?


5 – Desenhe o destino que os deuses reservaram a cada uma das personagens abaixo:

a) Tântalo

b) Enômao

c) Níobe

6 – Os três mitos que estudamos expressaram as características principais da idéia de determinismo? Quais são elas?

7 – Você acredita no determinismo? Isto é, você pensa que há algo ou alguém que determina tudo que vai acontecer na sua vida? Explique.






8 – Na música abaixo, da banda Titãs, explique qual é o destino da personagem Marvin.

TITÃS - MARVIN

Meu pai não tinha educação
Ainda me lembro, era um grande coração
Ganhava a vida com muito suor
E mesmo assim não podia ser pior
Pouco dinheiro pra poder pagar
Todas as contas e despesas do lar
Mas Deus quis vê-lo no chão
Com as mãos levantadas pro céu
Implorando perdão
Chorei, meu pai disse: Boa sorte,
Com a mão no meu ombro
Em seu leito de morte
E disse
Marvin, agora é só você
E não vai adiantar
Chorar vai me fazer sofrer.
Três dias depois de morrer
Meu pai, eu queria saber
Mas não botava nem um pé na escola
Mamãe lembrava disso a toda hora
Todo dia antes do sol sair
Eu trabalhava sem me distrair
Às vezes acho que não vai dar pé
Eu queria fugir, mas onde eu estiver
Eu sei muito bem o que ele quis dizer
Meu pai, eu me lembro, não me deixa esquecer
Ele disse
Marvin, a vida é pra valer
Eu fiz o meu melhor
E o seu destino eu sei de cor
E então um dia uma forte chuva veio
E acabou com o trabalho de um ano inteiro
E aos treze anos de idade eu sentia todo o peso do mundo em minhas costas
Eu queria jogar mas perdi a aposta.
Trabalhava feito um burro nos campos
Só via carne se roubasse um frango
Meu pai cuidava de toda a família
Sem perceber segui a mesma trilha
Toda noite minha mãe orava
Deus, era em nome da fome que eu roubava
Dez anos passaram, cresceram meus irmãos
E os anjos levaram minha mãe pelas mãos
Chorei, meu pai disse: Boa sorte
Com a mão no meu ombro
Em seu leito de morte
Marvin, agora é só você
E não vai adiantar
Chorar vai me fazer sofrer.
Marvin, a vida é pra valer
Eu fiz o meu melhor o seu destino eu sei de cor

Titãs. Titãs, 1984


PROFª Margarida Jansen ENSINO MÉDIO- Filosofia

2 – Liberdade segundo Sartre: a escolha

Tântalo e Níobe ficaram impotentes diante dos castigos que receberam. Essa impotência de mudar a situação significa ausência de liberdade? Quando não conseguimos conquistar alguma coisa dizemos: “Não somos livres”. Em outras palavras, quando conseguimos sair da situação de impotência, quando vencemos as adversidades, declaramo-nos livres; porém, quando não as vencemos, declaramo-nos não-livres.

Para pensar nesta questão, vejamos o que o filósofo francês Jean-Paul Sartre escreveu. Segundo ele, se estamos diante de um rochedo e este bloqueia nossa passagem, nós tentaremos passar por ele com uma série de técnicas, como a do alpinismo. Mesmo que não consigamos escalar o rochedo, fomos nós quem escolhemos pela escalada, foi a nossa liberdade que optou em ultrapassá-lo. O projeto era escalar, mas se não houve a realização da escalada, não deixamos de ser livres. O que Sartre apontou é que as pessoas não diferenciam o projeto da realização: o fato de não conseguirem escalar o rochedo não significa que não sejam livres, significa que são impotentes. Liberdade não é a obtenção do que se quer, o êxito de uma realização em nada importa para a liberdade.

Suponhamos que você gostaria de ir à festa de aniversário de seu amigo, mas no caminho seu carro quebrou e você talvez não consiga chegar a tempo. O fato de você não conseguir realizar seu projeto (ir à festa) não significa que você não seja livre; significa, somente, que você não consegue vencer a uma adversidade. A liberdade manifesta-se na escolha que você realiza em ir à festa. Em seguida, você escolhe em consertar o carro, mas não sabe; escolhe em procurar um mecânico, mas não encontra. Isto é, escolhe em escapar da adversidade. A liberdade, segundo Sartre, é esta “autonomia de escolha”[1] que independe da realização do projeto: “Minha liberdade de escolher não deve ser confundida com minha liberdade de obter[2]. Isto é, como fazemos escolhas a todo momento, somos livres e estamos condenados à liberdade.


VAMOS FILOSOFAR...

1 – Ao não conseguirmos realizar um projeto deixamos de ser livres? Explique.


2 – A liberdade é a obtenção daquilo que queremos, segundo Sartre? Explique.


3 – Para Sartre, como se manifesta nossa liberdade? Explique.




3– Liberdade segundo Sartre: a situação, o ser e o nada

O exemplo da festa de aniversário foi significativo: somos livres, mas nossa liberdade é exercida em meio a uma situação. O desejo é de chegar à festa; por isso que é doloroso ficar na rua com o carro quebrado, sem utensílios e sabedoria para consertá-lo, pensando na promessa que fiz a meu amigo de que estaria em seu aniversário, sem conseguir escapar do estado de coisas que me foi imposto pelos outros (um carro que não funciona).

A situação, neste caso, é a condição de estar em um lugar que não é a festa, é o fato de conviver com o problema de não cumprir o que foi prometido no passado, de não dominar as técnicas (utensílios) que possibilitariam resolver o problema, de ver o estado de coisas criados por outros não resolver meus problemas. A liberdade não é abstrata, ela é concreta e a expressão de sua concretude é a situação – as escolhas que faço para resolver meus problemas são escolhas situadas, escolhas que têm como objetivo resolver problemas concretos.

O que me faz falta é estar na festa e o meu objetivo, o meu projeto, o meu fim, é chegar a tempo nela. Minha liberdade consiste em fazer escolhas que me levem até a festa, que me tirem do lugar onde estou, com o carro quebrado: o que eu quero é trocar uma situação por outra, superar uma situação e chegar até outra, ir além de uma situação que me incomoda e realizar a que desejo, transcender a atual situação. Em outros termos, o que eu quero é acabar com a atual situação, nadificá-la. Minha escolha pretende colocar um ponto final em meus problemas, exterminá-los. Meu projeto é tornar existente minha presença na festa, torná-la real, enteficá-la, dar ser a ela.

Sartre conseguiu mostrar que nossa liberdade se exerce em situação, nadificando ou enteficando realidades em nome de um projeto que queremos realizá-lo: no problema em questão, trata-se de nadificar a situação de ficar parado com o carro quebrado e dar ser a minha participação na festa – dar fim a uma situação e iniciar outra: “A liberdade, sendo escolha, é mudança”[3].

SARTRE: A LIBERDADE SE EXERCE, EM SITUAÇÃO, PARA TENTAR CUMPRIR UM PROJETO:


VAMOS FILOSOFAR...

1 – Cite quais são os problemas que a personagem do texto enfrenta na situação acima.



2 – Segundo Sartre, a liberdade é abstrata ou concreta? Explique.


3 – Segundo Sartre, exercemos nossa liberdade ao fazer escolhas que tentam cumprir nossos projetos. Qual é o projeto da personagem do texto e o que você faria para cumpri-lo?


4 – Para Sartre, qual é a relação da liberdade com o ser e o nada?

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5 – Relacionando a filosofia de Sartre sobre a liberdade ao poema da Cecília Meireles, explique porque a liberdade, ao ser uma escolha, leva algumas coisas ao nada e outras ao ser.

Ou isto ou aquilo
Cecília Meireles
Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

CECÍLIA MEIRELES. Poesia completa. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.


4 – Liberdade segundo Sartre: o problema da responsabilidade

“A conseqüência essencial de nossas observações anteriores é a de que o homem, estando condenado a ser livre, carrega nos ombros o peso do mundo inteiro: é responsável pelo mundo e por si mesmo enquanto maneira de ser”[4]. Tal é a conclusão de Sartre, vejamos como a liberdade desembocou no peso da responsabilidade sobre nós.

Sabemos que a idéia de determinismo expressa o controle de nossas vidas por parte de algo ou alguém e a impossibilidade de mudarmos nosso destino. Sabemos também que Sartre recusou a idéia de determinismo e demonstrou que somos nós quem escolhemos nossas ações e, assim, tornamo-nos livres, controlamos nossas vidas e ganhamos a possibilidade de mudá-la. Essa liberdade, como vimos, é situada, condicionada por questões concretas e, ao procurarmos resolver os problemas para realizar nosso projeto, nadificamos uma realidade e tornamos real uma outra.

Como escolhemos, realizamos projetos, acabamos com situações e criamos outras, somos nós os agentes de nossa história e da história da humanidade. Não há algo ou alguém movendo nossas vidas, não há determinismo: não há como responsabilizarmos os deuses por nossos acertos e por nossos erros. Somos nós os responsáveis pelas nossas vidas, já que somos nós que fazemos as escolhas. Se escolhemos em ir à festa, lutamos contra as adversidades e chegamos na mesma, somos os responsáveis por nossa participação; se escolhemos não ir à festa, somos os responsáveis por nossa ausência. A responsabilidade acompanha a liberdade e é inseparável dela.

VAMOS FILOSOFAR...

1 – Para Sartre, podemos responsabilizar os deuses por nossos erros e por nossos acertos? Explique.

2 – Para Sartre, é possível separar a liberdade da responsabilidade? Explique.


3 – Dê dois exemplos de escolhas que você fez, escrevendo as responsabilidades que precisou assumir.


A – TEXTO COMPLEMENTAR

LIBERDADE E FACTICIDADE: A SITUAÇÃO

“(...) O coeficiente de adversidade das coisas, em particular, não pode constituir um argumento contra nossa liberdade, porque é por nós, ou seja, pelo posicionamento prévio de um fim, que surge o coeficiente de adversidade. Determinado rochedo, que demonstra profunda resistência se pretendo removê-lo, será, ao contrário, preciosa ajuda se quero escalá-lo pra contemplar a paisagem. Em si mesmo – se for sequer possível imaginar o que ele é em si mesmo -, o rochedo é neutro, ou seja, espera ser iluminado pro um fim de modo a se manifestar como adversário ou auxiliar. Também só pode manifestar-se dessa ou daquela maneira no interior de um complexo-utensílio já estabelecido. Sem picaretas e ganchos, veredas já traçadas, técnica de escalagem, o rochedo não seria nem fácil nem difícil de escalar; a questão não seria colocada, e o rochedo não manteria relação de espécie alguma com a técnica do alpinismo. Assim, ainda que as coisas em bruto (...) possam desde a origem limitar nossa liberdade de ação, é nossa liberdade mesmo que deve constituir previamente a moldura, a técnica e os fins em relação aos quis as coisas irão manifestar-se como limites. Mesmo se o rochedo se revela como ‘muito difícil de escalar’ e temos de desistir da escalada, observemos que ele só se revela desse modo por ter sido originariamente captado como ‘escalável’; portanto, é nossa liberdade que constitui os limites que irá encontrar depois. (...) O ser dito livre é aquele que pode realizar seus projetos. Mas, para que o ato possa comportar uma realização, é preciso que a simples projeção de um fim possível se distinga a priori da realização deste vim. Se bastasse conceber para realizar, estaria eu mergulhado em um mundo semelhante ao do sonho, no qual o possível não se distingue de forma alguma do real. Ficaria condenado, então, a ver o mundo se modificar segundo os caprichos das alterações de minha consciência, e não poderia praticar, em relação a minha concepção, a ‘colocação entre parênteses’ e a suspensão de juízo que irão distinguir uma simples ficção de uma escolha real. Aparecendo desde o momento em que é simplesmente concebido, o objeto não seria nem escolhido nem desejado. Abolida a distinção entre o simples desejo, a representação que posso escolher e a escolha, a liberdade desapareceria com ela. Somos livres quando o último termo pelo qual fazemos anunciar a nós mesmos o que somos constitui um fim, ou seja, não um existente real, como aquele que, na suposição precedente, viria a satisfazer nosso desejo, mas sim um objeto que ainda não existe (...)”.

Aula e atividades de Filosofia com músicas

PROFª: Margarida Jansen

ENSINO MÉDIO- Filosofia

LIBERDADE: RAZÃO E AUTONOMIA


“Esclarecimento é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado”
Immanuel Kant


1 – O problema da escolha sem autonomia em nossa sociedade.

Sabemos que a liberdade, como apontou Sartre, expressa-se na escolha que fazemos durante todo o tempo. Porém, talvez as escolhas que estamos fazendo estejam corrompidas, talvez estejamos agindo sob influência de interesses que não são verdadeiramente nossos. Vejamos a música abaixo para situarmos melhor o problema que expomos:

Adimirável Chip Novo
Pitty
Pane no sistema, alguém me desconfigurou
Aonde estão meus olhos de robô?
Eu não sabia, eu não tinha percebido
Eu sempre achei que era vivo
Parafuso e fluido em lugar de articulação
Até achava que aqui batia um coração
Nada é orgânico, é tudo programado
E eu achando que tinha me libertado,
Mas lá vem eles novamente e eu sei o que vão fazer:
Reinstalar o sistema
Pense, fale, compre, beba
Leia, vote, não se esqueça
Use, seja, ouça, diga
Tenha, more, gaste e viva
Pense, fale, compre, beba
Leia, vote, não se esqueça
Use, seja, ouça, diga...
Não senhor, Sim senhor, Não senhor, Sim senhor

Pane no sistema, alguém me desconfigurou
Aonde estão meus olhos de robô?
Eu não sabia, eu não tinha percebido
Eu sempre achei que era vivo
Parafuso e fluido em lugar de articulação
Até achava que aqui batia um coração
Nada é orgânico, é tudo programado
E eu achando que tinha me libertado,
Mas lá vem eles novamente e eu sei o que vão fazer:
Reinstalar o sistema
Pense, fale, compre, beba
Leia, vote, não se esqueça
Use, seja, ouça, diga
Tenha, more, gaste e viva
Pense, fale, compre, beba
Leia, vote, não se esqueça
Use, seja, ouça, diga...
Não senhor, Sim senhor, Não senhor, Sim senhor
Mas lá vem eles novamente e eu sei o que vão fazer:
Reinstalar o sistema
PITTY. Admirável chip novo, 2003.

O refrão da música compõe-se de imperativos que nos são ininterruptamente transmitidos pela televisão, pelo rádio, pela internet, pelos jornais, pelas revistas, pelos outdoors, por religiões e até pelos nossos amigos. Embora possamos passar a vida sem perceber, escolhemos entre roupas da marca A ou B, refrigerante A ou B; carro A ou B, eletrodoméstico A ou B, deus A ou B. É verdade que há uma escolha, é verdade que podemos escolher por A e não por B; porém, é verdade também que muitas vezes agimos influenciados sobre os imperativos que nos foram transmitidos.
A música expressa que as escolhas que fazemos podem estar corrompidas pelo consumismo contemporâneo, expressa que fazemos escolhas influenciadas por falsas necessidades, por interesses exteriores a nós mesmos. Isto é, a comparação feita pela música, entre nós e os robôs, retrata justamente o modo como somos “programados” a realizar escolhas que beneficiam interesses que não são necessariamente os nossos, a escolher coisas que não precisamos, a fazer coisas que podem até estar contrárias a nossos interesses. E ainda podemos aceitar estas coisas de bom grado: “Não senhor, Sim senhor, Não senhor, Sim senhor”. Caso não gostemos e fazemos algo contrário aos imperativos que nos foram transmitidos, a música mostra a saída que é usada para tudo continuar do modo como está: “Lá vem eles novamente e eu sei o que vão fazer: reinstalar o sistema”.
Portanto, o problema da liberdade em nossa sociedade é ainda um problema não resolvido, trataremos neste período justamente das escolhas que fazemos e que podem ainda não serem suficientes para sermos livres. Segundo a música, em cada um de nós é como se houvesse um chip, como se não fôssemos livres.



VAMOS FILOSOFAR...


1 – Quais são os imperativos que a música demonstra que nos são impostos ininterruptamente?
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2 – Ao escolhermos um produto de uma marca, e não de outra, após sermos convencidos por uma propaganda, somos livres? Explique.
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3 – Explique como a música, ao comparar-nos com robôs, mostra que não somos livres.
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4 – Você já foi influenciado por propagandas a adquirir algo que não tinha muita necessidade? Exemplifique e explique como sua liberdade foi afetada.
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5 – Desenhe um exemplo de propaganda que influencia as pessoas e, assim, afeta a liberdade delas.













PROFª: Margarida Jansen ENSINO MÉDIO- Filosofia


Ousar pensar: a saída de Voltaire para o problema da escolha sem autonomia em nossa sociedade.

Voltaire, filósofo francês que viveu entre 1694 e 1778, tentou encontrar uma solução para o problema que estamos discutindo, embora, seja evidente, em um contexto diferente. No Dicionário filosófico, ele escreveu um verbete intitulado “Liberdade de Pensamento”, expondo um conflito entre um general inglês (Boldmind) e um funcionário da Inquisição na Espanha (Medroso). Deste conflito, Voltaire indicou o caminho para escolhermos sem seguir interesses que não são verdadeiramente nossos. Vamos acompanhar o diálogo para encontrar esse caminho:

Liberdade de pensamento

“Boldmind: Sois, portanto, sargento dos dominicanos? Exerceis um bem vil ofício.
Medroso: É verdade; mas gostei mais de ser criado deles do que ser vítima e preferi a desgraça de queimar o meu próximo à de ser eu próprio cozido.
Boldmind: Que horrível alternativa! Éreis cem vezes mais felizes sob o jugo dos mouros que vos deixaram estagnar livremente no meio das vossas superstições e que, embora vencedores, não se arrogavam o direito inaudito de pôr as almas a ferros.
Medroso: Que quereis? Não nos é permitido escrever, nem falar, nem mesmo pensar. Se falamos, torna-se fácil interpretar as nossas palavras e mais ainda os nossos escritos. Enfim, como não podem condenar-nos a um auto-de-fé pelos nossos pensamentos secretos, ameaçam-nos de sermos eternamente queimados por ordem do próprio Deus se não pensarmos como os dominicanos. Persuadiram o governo que se possuíssemos o senso comum todo o Estado ficaria em combustão e a nação tornar-se-ia a mais desgraçada da Terra.
Boldmind: Achais que somos assim desgraçados, nós, ingleses, que cobrimos os mares com os nossos barcos e viemos ganhar para vós batalhas nos confins da Europa? Vede os holandeses que vos desapossaram de quase todas as vossas descobertas na Índia e hoje se enfileiram entre os vossos protetores: pensais que sejam malditos de Deus por haverem concedido inteira liberdade à imprensa e por fazerem o comércio dos pensamentos humanos? Foi menos poderoso o império romano por Cícero haver escrito com liberdade?
Medroso: Quem é Cícero? Nunca ouvi falar desse homem; não se trata aqui de Cícero, trata-se de nosso santo pai, o papa, e de Santo Antônio de Pádua, e sempre ouvi dizer que a religião romana está perdida se os homens começam a pensar.
Boldmind: Não cabe a vós acreditá-lo, pois estais seguro que a vossa religião é divina e que as portas do inferno não podem prevalecer contra ela. Se assim é, nada poderá destruí-la.
Medroso: Não, mas pode ser reduzida a pouca coisa. E foi por terem pensado que a Suécia, a Dinamarca, toda a vossa ilha e metade da Alemanha gemem na pavorosa desgraça de não mais serem súditos do papa. Diz-se mesmo que se os homens continuassem a guiar-se pelas suas falsas luzes acabarão em breve por ater à simples adoração de Deus e à virtude. Se alguma vez as portas do inferno prevalecerem até esse ponto, em que se tornará o Santo Ofício?
Boldmind: Se os primeiros cristãos não tivessem a liberdade de pensar, não é verdade que não existiria cristianismo?
Medroso: Que quereis dizer? Não vos entendo?
Boldmind: Acredito. Quero dizer que se Tibério e os primeiros imperadores dispusessem de dominicanos que houvessem impedido os primeiros cristãos de usar penas e tinta; se durante tanto tempo não tivesse sido permitido pensar livremente no império romano, tornar-se-ia impossível aos cristãos estabelecer os seus dogmas. Portanto, se o cristianismo só se formou pela liberdade de pensamento, por que contradição, por que injustiça desejaria aniquilar hoje essa liberdade sobre a qual está fundado?
Quando vos propõem algum negócio interessante, não o examinais demoradamente, antes de o concluirdes? Haverá no mundo maior interesse que o da nossa felicidade ou eterna desgraça? Existem sobre a Terra cem religiões e todas vos condenam à danação por acreditares nos vossos dogmas, que essas religiões consideram absurdos e ímpios; examinai, portanto, esses dogmas.
Medroso: Como posso examiná-lo? Não sou dominicano.
Boldmind: Sois homem e isso basta.
Medroso: Ai de mim! Sois bem mais homem que eu.
Boldmind: A vós apenas cabe aprender a pensar; haveis nascido com espírito; sois uma ave na gaiola da Inquisição; o Santo Ofício aparou-vos as asas mas elas podem voltar a crescer. Quem não sabe geometria, pode aprendê-la; qualquer homem pode instruir-se: é vergonhoso que se deposite a alma nas mãos daqueles aos quais não se confiaria o dinheiro. Ousai pensar por vós mesmo.
Medroso: Há quem diga que, se toda a gente pensasse por si, a confusão seria prodigiosa.
Boldmind: Pelo contrário. Quando assistimos a um espetáculo, cada qual dá livremente a sua opinião e a paz não é perturbada; se, porém, algum insolente, protetor de algum mau poeta, quiser forçar todas as pessoas de gosto a considerarem bom o que lhes parece mau, os dois partidos podem acabar alvejando-se com maçãs, como já aconteceu em Londres. São estes tiranos dos espíritos que causaram parte das desgraças do mundo. Na Inglaterra, só somos felizes desde que cada qual goze livremente o direito de exprimir a sua opinião (...)” .

O problema que temos a resolver é: como fazer escolhas que reflitam o que realmente queremos, o que realmente necessitamos, sem sermos influenciados e manipulados por outrem? Voltaire, pela personagem Boldmind, indicou que estas escolhas precisam passar pelo critério do pensamento: trata-se de ousar pensar por nós mesmos, sem aderir a nenhum projeto sem antes examiná-lo com cuidado, sem entregar nossa alma seja a quem for.


Voltaire. Estátua de 1781, Museu de São Petesburgo.


VAMOS FILOSOFAR...


1 – Qual é o problema relativo à liberdade a ser resolvido em nossa sociedade?
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2 – Que tipo de trabalho a personagem Medroso realiza, segundo Voltaire no texto Liberdade de pensamento? Como esse trabalho é classificado pela personagem Boldmind?
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3 – Existe liberdade de pensamento na Espanha sob a Inquisição? O que a personagem Medroso alega para defender o comportamento da Inquisição? Boldmind concorda com Medroso ?
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4 – Para que a personagem Medroso se tornasse livre, Boldmind aconselhou: “A vós apenas cabe aprender a pensar; haveis nascido com espírito; sois uma ave na gaiola da Inquisição; o Santo Ofício aparou-vos as asas mas elas podem voltar a crescer. Quem não sabe geometria, pode aprendê-la; qualquer homem pode instruir-se: é vergonhoso que se deposite a alma nas mãos daqueles aos quais não se confiaria o dinheiro. Ousai pensar por vós mesmo” . Explique qual deve ser o comportamento de Medroso para que ele seja livre.
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5 – Como Voltaire resolveu a questão de fazermos escolhas sem sermos livres em nossa sociedade? Você concorda com a solução dele? Explique.
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6 – Leia a letra da música abaixo e relacione-a com o texto de Voltaire para explicar se somos livres ao fazermos o que a televisão nos propõe.



PROFª: Margarida Jansen ENSINO MÉDIO- Filosofia

Televisão
Titãs

A televisão me deixou burro, muito burro demais
Agora todas coisas que eu penso me parecem iguais
O sorvete me deixou gripado pelo resto da vida
E agora toda noite quando deito é boa noite, querida.
Ô cride, fala pra mãe
Que eu nunca li num livro que um espirro fosse um vírus sem cura
Vê se me entende pelo menos uma vez, criatura!
Ô cride, fala pra mãe !
A mãe diz pra eu fazer alguma coisa mas eu não faço nada
A luz do sol me incomoda, então deixo a cortina fechada
É que a televisão me deixou burro, muito burro demais
E agora eu vivo dentro dessa jaula junto dos animais.
Ô cride, fala pra mãe
Que tudo que a antena captar meu coração captura
Vê se me entende pelo menos uma vez, criatura!
Ô cride, fala pra mãe!
TITÃS. Televisão, 1985.
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3 – Esclarecimento: a saída de Kant para o problema da escolha sem autonomia em nossa sociedade.


Kant (1724 - 1804) foi mais um filósofo que pensou nas condições de possibilidades da liberdade e, tal como Voltaire, preocupou-se em impedir que fôssemos manipulados por interesses exteriores aos nossos. Para isso, Kant aposta em um movimento do qual todos precisariam participar: trata-se de um esclarecimento que retiraria a humanidade da posição de menoridade.
Segundo Kant, encontramo-nos na posição de menoridade por não usarmos nosso entendimento da maneira que deveríamos; por covardia e preguiça, apenas orientamo-nos por razões alheias a nossa e, assim, damos origem a tutores que dizem o que devemos fazer sobre as mais variadas questões do dia-a-dia. Nosso erro, portanto, é preferir a orientação de outrem e não usarmos nosso entendimento com autonomia. Um bom exemplo desse erro é a música abaixo:



Pacato Cidadão
Skank
Composição: Samuel Rosa E Chico Amaral
Ô pacato cidadão, te chamei a atenção
Não foi à toa, não
C\'est fini la utopia, mas a guerra todo dia
Dia a dia não
E tracei a vida inteira planos tão incríveis
Tramo à luz do sol
Apoiado em poesia e em tecnologia
Agora à luz do sol
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Ô pacato cidadão, te chamei a atenção
Não foi à toa, não
C\'est fini la utopia, mas a guerra todo dia
Dia a dia não
E tracei a vida inteira planos tão incríveis
Tramo à luz do sol
Apoiado em poesia e em tecnologia
Agora à luz do sol
Pra que tanta TV, tanto tempo pra perder
Qualquer coisa que se queira saber querer
Tudo bem, dissipação de vez em quando é bão
Misturar o brasileiro com alemão
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Ô pacato cidadão, te chamei a atenção
Não foi à toa, não
C\'est fini la utopia, mas a guerra todo dia
Dia a dia não
E tracei a vida inteira planos tão incríveis
Tramo à luz do sol
Apoiado em poesia e em tecnologia
Agora à luz do sol
Pra que tanta sujeira nas ruas e nos rios
Qualquer coisa que se suje tem que limpar
Se você não gosta dele, diga logo a verdade
Sem perder a cabeça, perder a amizade
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Ô pacato cidadão, te chamei a atenção
Não foi à toa, não
C\'est fini la utopia, mas a guerra todo dia
Dia a dia não
E tracei a vida inteira planos tão incríveis
Tramo à luz do sol
Apoiado em poesia e em tecnologia
Agora à luz do sol
Consertar o rádio e o casamento é
Corre a felicidade no asfalto cinzento
Se abolir a escravidão do caboclo brasileiro
Numa mão educação, na outra dinheiro
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização
Pacato cidadão
Ô pacato da civilização.

Agimos como um “pacato cidadão” e somos nós mesmos os culpados da posição de menoridade em que nos encontramos. Se hoje estamos dominados por tutores, isso só aconteceu por não caminharmos com a autonomia da nossa razão. É assim que funciona o movimento proposto por Kant: deixar a pacatez de lado e pensarmos por nós mesmos sobre todas as questões que nos são pertinentes. Dessa forma, mesmo depois de alguns erros, aprenderíamos a caminhar sozinhos.
Ao invés da identificação cega com um líder político ou religioso, ao invés de seguir irrefletidamente algum órgão de imprensa, precisaríamos, no movimento proposto por Kant,
Immanuel Kant (1704-1804) pensarmos para adquirir um entendimento próprio e a partir daí, expor publicamente nossas idéias: precisaríamos espalhar nossas idéias ao nosso entorno, movimentando o uso autônomo da razão naqueles que estão vivendo conosco. Essa conduta é bem diferente da conduta do “pacato cidadão” da música, e não só é diferente, mas oposta.
Sairíamos da menoridade e findaríamos com os tutores se nós mesmos conduzirmo-nos nossas ações. Nossa liberdade constrói-se pelo uso autônomo da razão e pela sua publicidade (que aqui não deve ser entendida no sentido mercadológico, trata-se do uso público da razão). O movimento de Esclarecimento, proposto por Kant, e a ousadia de pensamento, proposta por Voltaire, encontram-se, então, na semelhança de seus objetivos e nos seus métodos: ambos anseiam a liberdade, ambos apostam na razão pra atingir este fim.

VAMOS FILOSOFAR...


1 – Kant e Voltaire têm um projeto parecido sobre a liberdade. Qual é esse projeto?
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2 – Kant propõem um movimento para acabar com a posição de menoridade em que se encontra a humanidade. Explique:

a) o que é menoridade?
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b) qual é o movimento proposto por Kant e como ele funcionaria?
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3 – Relacione a idéia de “menoridade”, de Kant, com a expressão “pacato cidadão” da música do Skank e explique se, na sua cidade, as pessoas são livres.
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4 – Segundo Kant, quais seriam as conseqüências para os tutores ao expormos nossas idéias publicamente?
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5 – Kant e Voltaire têm um método em comum para alcançar a liberdade? Qual é ele e como funciona?
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TEXTO COMPLEMENTAR

Eu, etiqueta
Em minha calça está grudado um nome
que não é meu de batismo ou de cartório
um nome... estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
que jamais pus na boca, nesta vida.
Em minha camiseta, a marca de cigarro
que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produto
que nunca experimentei
mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
de alguma coisa não provada
por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
minha gravata e cinto e escova e pente,
meu copo, minha xícara,
minha toalha de banho e sabonete,
meu isso, meu aquilo,
desde a cabeça ao bico dos sapatos,
são mensagens,
letras falantes, gritos visuais,
ordens de uso, abuso, reincidência,
costume, hábito, premência, indispensabilidade,
e fazem de mim homem-anúncio itinerante,
escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É doce estar na moda, ainda que a moda
seja negar minha identidade,
trocá-la por mil, açambarcando
todas as marcas registradas,
todos os logotipos do mercado.
Com que incidência demito-me de ser
eu que antes era e me sabia
tão diverso de outros, tão mim-mesmo,
ser pensante, sentinte e solidário
com outros seres diversos e conscientes
de sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio,
ora vulgar ora bizarro,
em língua nacional ou em qualquer língua
(qualquer, principalmente).
E nisto me comprazo, tiro glória
de minha anulação.
Não sou – vê lá – anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
para anunciar, para vender
em bares festas praias pérgulas piscinas,
e bem à vista exibo esta etiqueta
global no corpo que desiste
de ser veste e sandália de uma essência
tão viva, independente,
que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
meu gosto e capacidade de escolher,
minhas idiossincrasias tão pessoais,
tão minhas que no rosto se espelhavam,
e cada gesto, cada olhar,
cada vinco da roupa
resumia uma estética?
Hoje sou costurado, sou tecido,
sou gravado de forma universal,
saio da estamparia, não de casa,
da vitrine me tiram, recolocam,
objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
de ser não eu, mas artigo industrial,
peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem,
meu nome novo é coisa.
Eu sou a coisa, coisamente.
Carlos Drummond de Andrade

O que é Filosofia


Profª Margarida Jansen

O que é Filosofia

A palavra filosofia é de origem grega. É composta por duas outras: philo e sophia. Philo deriva-se de philia, que significa amizade, amor fraterno, respeito entre os iguais. Sophia quer dizer sabedoria e dela vem à palavra sophos, sábio.

Filosofia significa, portanto, amizade pela sabedoria, amor e respeito pelo saber. Filósofo: o que ama a sabedoria, tem amizade pelo saber, deseja saber. Assim a filosofia indica um estado de espírito da pessoa que ama, isto é, daquela que deseja o conhecimento, o estima, o procura e o respeita.

Pitágoras de Samos teria afirmado que a sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens podem desejá-la ou amá-la, tornando-se filósofos. “Quem quiser ser filósofo necessitará infantilizar-se, transformar-se em menino”. (M. Garcia Morente).

A Caixa de Pandora

A caixa de Pandora é uma expressão muito utilizada quando se quer fazer referência a algo que gera curiosidade, mas que é melhor não ser estudada (revelada).

Sua origem está relacionada ao mito grego do surgimento da primeira mulher, Pandora, criada pelos deuses para castigar o homem. Ela abriu um recipiente e libertou todos os males que se abateram sobre o homem. Segundo a mitologia a Terra era sombria e sem vida, os deuses e a natureza começaram a dar vida e pôr cada coisa em seu devido lugar, porém faltava um animal nobre que pudesse servir de recipiente para um espírito, essa tarefa ficou incumbida aos Titãs Epimeteu (aquele que reflete tardiamente) e Prometeu (aquele que prevê).

Epimeteu criou os animais dando-lhes todas as características distintas, Prometeu ficou responsável por criar um ser à imagem e semelhança dos deuses. Com isso pegou um pouco de terra e molhou com a água de um rio, obtendo assim argila, foi moldando-a com carinho e dedicação até conseguir uma imagem semelhante à de seus deuses. Porém, o homem estava sem vida, por isso Prometeu pegou todas as coisas boas que seu irmão Epimeteu colocou nos animais e também colocou no homem, mas ainda faltava algo mais forte. Prometeu tinha amizade com uma deusa, Atená, essa com admiração pela obra dos Titãs deu ao o homem o espírito que lhe faltava.

Após ter destruído seu próprio pai, Zeus voltou suas atenções para a humanidade recém-criada e dela cobrava devoção, sacrifícios em troca de proteção. A partir do momento em que Zeus e seus irmãos passaram a disputar poder com a geração dos Titãs, Prometeu, mesmo não tendo participado da batalha era visto como inimigo e os seres humanos uma ameaça constante.

Em defesa do homem Prometeu e Zeus se encontraram em Mecone (Grécia) para decidirem os deveres e os direitos da humanidade. Prometeu pediu para que os deuses cobrassem mesmo por sua proteção, para isso teve a idéia de por à prova o poder e a visão justa e clara de Zeus. Matou um belo e imenso touro, partiu-o ao meio e pediu para que os deuses do Olimpo escolhessem uma das partes, pois a outra caberia aos humanos. Porém, ele pôs em um dos montes apenas ossos e cobriu-os com o sebo do animal, esse apresentou ser maior que o outro monte de carne. Com toda sua soberba Zeus escolheu o monte maior, no entanto, ao descobrir que havia sido enganado por Prometeu, decidiu vingar-se dele negando à humanidade o último dos dons que necessitavam para se manterem vivos: o fogo.

Com o objetivo de salvar sua criação, Prometeu roubou uma centelha de fogo celeste e entregou aos homens. Ao perceber que o novo brilho que vinha da terra era fogo, Zeus decidiu se vingar do ladrão (Prometeu) e dos beneficiados com o fogo (a humanidade). Aprisionou Prometeu na parede de um penhasco na montanha caucasiana, com uma corrente inquebrável, todos os dias suas vísceras eram comidas pelas aves, como era imortal durante a noite os órgãos e restituíam e no dia seguinte as aves voltam e comiam novamente, assim era a sua tortura diária. Antes de ser aprisionado Prometeu deixou um recipiente, seu formato não é descrito ao certo, aqui será denominado de “caixa”, com seu irmão Epimeteu, e esse ficou incumbido de ser o guardião da caixa, não permitindo que ninguém se aproximasse dela. Para se vingar do homem, Zeus resolveu criar a mulher com a ajuda dos demais deuses, nela cada um dos deuses pôs uma de suas qualidades, dente elas a beleza e a inteligência e deu-lhe o nome de Pandora.
Zeus a enviou de presente para Epimeteu, esse não deu ouvido aos conselhos que o irmão havia lhe dado antes de partir, que era para não aceitar nenhum presente dos deuses, aceitou Pandora.

Ela o seduziu e, após cair na armadilha de Zeus, Epimeteu caiu em um sono profundo, aproveitando-se disso Pandora abriu a caixa e quase todos os males que estavam lá dentro foram libertos, coisas tão ruins a amedrontaram fazendo-a fechar a caixa, porém, o último e mais importante permanecera dentro da caixa, o destruidor da esperança.
Por isso a mulher ficou conhecida como o grande mal da humanidade. A estória mitológica é um pouco semelhante à bíblica, da criação do homem e da mulher (Adão e Eva), pois nessa a mulher também é a responsável pela desgraça humana.

Por Eliene Percília

A Filosofia Grega

A filosofia, entendida como aspiração ao conhecimento racional, lógico e sistemático da realidade natural e humana, da origem e causas do mundo e de suas transformações, da origem e causas das ações humanas e do próprio pensamento, é um fato tipicamente grego.

Evidentemente, isso não quer dizer, de modo algum que outros povos, tão antigos quanto os gregos, como os chineses, o hindus, os japoneses, os árabes, os persas, os hebreus, os africanos ou os índios da América, não possuíam sabedoria, pois possuíam e possuem. Não quer dizer que todos esses povos não tivessem desenvolvido o pensar e as formas de conhecimento da Natureza e dos seres humanos, pois desenvolveram e desenvolvem.

Os chineses desenvolveram um pensamento muito profundo sobre a existência de coisas, seres e ações contrárias ou opostas, que formam a realidade. Deram às oposições o nome de dois princípios: Yin e Yang. Yin é o principio feminino passivo na Natureza, representado pela escuridão, o frio e a umidade; Yang é o principio masculino ativo na Natureza, representado pela luz, o calor e o seco. Os dois princípios se combinam e formam todas as coisas, por isso, são feitas de contrários ou de oposições. O mundo, portanto, é feito da atividade masculina e da passividade feminina.

Já no pensamento grego, por exemplo, o próprio Pitágoras diz que a Natureza é feita de um sistema de relações ou de proporções matemáticas produzidas a partir da unidade (o numero 1 e o ponto), da oposição entre os números pares e impares, e da combinação entre as superfícies e os volumes (as figuras geométricas), de tal modo que essas proporções e combinações apareçam para nossos órgãos dos sentidos sob a forma de qualidades contrárias: quente-frio, grande-pequeno, seco-úmido, áspero-liso, claro-escuro, duro-mole, etc., para Pitágoras, o pensamento alcança a realidade em sua estrutura matemática enquanto nossos sentidos ou nossa percepção alcançam o modo como à estrutura matemática da Natureza aparece para nós, isto é, sob a forma de qualidades opostas.

A filosofia é um modo de pensar e exprimir os pensamentos que surgiu especificamente com os gregos e que, por razões históricas e políticas, tornou-se, depois, o modo de pensar e de se exprimir predominante da chamada cultura européia ocidental, da qual, em decorrência da colonização portuguesa do Brasil, nós também participamos.

Através da filosofia, os gregos instituíram para o Ocidente europeu as bases e os princípios fundamentais do que chamamos de razão, racionalidade, ciência, ética, política, técnica, arte. Aliás, basta observarmos que palavras como lógica, técnica, ética, política, monarquia, anarquia, democracia, física, zoológico, farmácia, entre muitas outras, são palavras gregas, para percebemos a influência decisiva e predominante da filosofia grega sobre a formação do pensamento e das instituições das sociedades européias ocidentais.

O LEGADO DA FILOSOFIA GREGA PARA O OCIDENTE EUROPEU


Por causa da colonização européia das Américas, nós também fazemos parte – ainda que de modo inferiorizado e colonizado – do Ocidente europeu e assim também somos herdeiros do legado que a filosofia grega deixou para o pensamento ocidental europeu.

Desse legado, podemos destacar como principais contribuições as seguintes:

• A idéia de que a Natureza opera obedecendo a leis e princípios necessários e universais, isto é, os mesmos em toda parte e em todos os tempos. A lei da gravitação afirma que todo corpo, quando sofre a ação de outro, produz uma reação igual e contrária que pode ser calculada usando elementos da massa do corpo afetado, a velocidade e o tempo com que à ação e a reação se deram. Essa lei é necessária, isto é, nenhum corpo do Universo escapa dela e pode funcionar de outra maneira que não desta; e esta lei é universal, isto é, é válida por todos os corpos em todos os tempos e lugares.

• A idéia de que as leis necessárias e universais da Natureza podem ser plenamente conhecidas pelo nosso pensamento não são conhecimentos misteriosos e secretos, que precisariam ser revelados por divindades, mas são conhecimentos que o pensamento humano, por sua própria força e capacidade, pode alcançar.

• A idéia de que nosso pensamento também opera obedecendo a leis, regras e normas universais e necessárias, segundo as quais podemos distinguir o verdadeiro do falso.

• A idéia de que as práticas humanas, a ação moral, a política, as técnicas e as artes dependem da vontade livre, da deliberação e da discussão, da nossa escolha passional (ou emocional) ou racional, de nossas preferências, segundo certos valores e padrões, foram estabelecidos pelos próprios seres humanos e não por imposições misteriosas e incompreensíveis, que lhes teriam sido feitas por forças secretas, invisíveis, sejam elas divinas ou naturais, e impossíveis de serem conhecidas.

• A idéia de que os acontecimentos naturais e humanos são necessários, porque obedecem a leis naturais ou da natureza humana, também podem ser contingentes ou acidentais, quando dependem das escolhas e deliberações dos homens, em condições determinadas.

Um dos legados mais importantes da filosofia grega é, portanto, essa diferença entre o necessário e o contingente, pois ela nos permite evitar o fatalismo – “tudo é necessário, temos que nos conformar e nos resignar” –, mas também evitar a ilusão de que podemos tudo quanto quisermos, se alguma força extra-natural ou sobrenatural nos ajudar, pois a natureza segue leis necessárias que podemos conhecer e nem tudo é possível, por mais que queiramos.

• A idéia de que os seres humanos, por natureza, aspiram ao conhecimento verdadeiro, a felicidade, a justiça, os seres humanos não vivem nem agem cegamente, criam valores pelos quais dão sentido as suas vidas e as suas ações.

A filosofia surge, portanto, quando alguns gregos, admirados e espantados com a realidade, insatisfeitos com as explicações que a tradição lhes dera, começaram a fazer perguntas e buscar respostas para elas, demonstrando que o mundo e os seres humanos, os acontecimentos e as ações humanas podem ser conhecidas pela razão humana, e que a própria razão é capaz de conhecer a si mesma.

Em suma, a filosofia surgiu quando se descobriu que a verdade do mundo e dos humanos não era algo secreto e misterioso, que precisasse ser revelado por divindades a alguns escolhidos, mas, ao contrário, podia ser conhecida por todos, através da razão, que é a mesma em todos; quando se descobriu que tal conhecimento depende do uso correto da razão ou do pensamento e que, além da verdade poder ser conhecida por todos, podia, pelo mesmo motivo, ser ensinada ou transmitida.

Segundo Descartes(1596-1650),filósofo de grande importância na história do pensamento,a essência do homem é pensar.Por isso dizia:"Sou uma coisa que pensa, isto é, que duvida, que afirma, que ignora muitas, que ama, que odeia, que quer e não quer, que também imagina e que sente". O pensamento faz a grandeza ou a pequenez do homem. A grandeza decorre do pensamento bem pensado, que a valia a multiplicação do real e se esforça para desvendá-lo atentamente, saboreando sua riqueza e diversidade. Tal pensamento aprendeu a filosofar: a desejar amorosamente a verdade, a amar a sabedoria. A pequenez humana decorre do pensamento obscuro, mesquinho que desconhece o sabor da busca do saber. Esse tipo de pensamento transforma-se em meio de ocultação da realidade. Por meio dele a atividade pensante, em vez de servir à liberdade pode transforma-se em instrumento de dominação social.

Aulas Filosofia


Profª Margarida Jansen Ensino Médio
Filosofia

Quando dizer é fazer
Objetivos
- Familiarizar os alunos com os conceitos-chave da teoria dos atos de fala e a importância que essa teoria ocupa na virada lingüístico-pragmática da filosofia.

- Trabalhar as habilidades de formação e aplicação de conceitos, formular exemplos e investigação de texto.

Observação: as atividades propostas abaixo pressupõem que os alunos tenham lido o texto "Quando dizer é fazer". Além disso, o professor poderá realizar uma aula expositiva sobre o tema, para esclarecer possíveis dúvidas dos alunos.
Exercício 1: O jogo dos atos de fala

Os alunos formam duplas ou trios em que elaborarão quatro frases, sendo que, em cada uma delas, deverá haver um tipo de ato de fala predominante. Pois, como vimos no texto, um ato de fala perlocucionário é também ilocucionário e locucionário, mas não é esse o seu sentido dominante. Assim, os alunos poderão elaborar atos de fala predominantemente locucionários (L), quando a única ação do sujeito é a de realizar o ato de fala; ilocucionário (I), quando o sujeito realiza uma ação no ato de dizer algo; e perlocucionário (P), quando o sujeito pretende produzir um efeito em seu ouvinte.

Elaboradas as questões, um grupo disputará com outro da seguinte maneira: um grupo A lerá sua frase e verá se o grupo B classifica a sua frase do mesmo modo como eles a classificaram (L, I ou P). Caso a classificação coincida, o grupo B marcará ponto. A seguir, o grupo B lerá sua frase para o grupo A, repetindo o processo. Sempre há a possibilidade de que o próprio grupo tenha classificado errado sua frase, por isso, a aceitação ou não deve ser pautada pela argumentação de ambas as equipes em busca de um consenso. A mediação do professor deve ser no sentido
de garantir que o diálogo ocorra de modo organizado. Caso considere que os alunos ainda não compreenderam adequadamente os conceitos, o professor pode fazer mais uma rodada, em que os grupos se enfrentarão com grupos diferentes da rodada anterior.
Exercício 2: força ilocucionária

Classifique as expressões abaixo com os números de 1 a 5 quando se tratarem de:

1 - veridictivas
2 - exercitivas
3 - comissivas
4 - conductivas
5 - expositivas

a) Parabéns pelo seu novo emprego! ( )

b) Na verdade, o que eu pretendia dizer é que eu trabalho melhor sozinho do que em grupo. ( )

c) Aonde você vai a esta hora da noite? ( )

d) Garanto que no que depender de mim, correrá tudo certo! ( )

e) Pelas evidências encontradas no local do crime, a única possibilidade é que Pedro seja o assassino. ( )

f) Isso não pode ficar assim! Exijo uma retratação imediata! ( )

g) Pobre João, se continuar com esse comportamento machista nunca conquistará o amor de Maria. ( )

h) - O senhor aceita esta mulher como sua legitima esposa?
- Sim. ( )

i) - Eu vos declaro marido e mulher. ( )

j) Espero que você não se meta novamente em encrencas. ( )

Feita a classificação, o professor pode propor aos alunos que leiam suas respostas e as justifiquem.

Respostas para controle: a-4, b-5, c-2, d-3, e-1, f-2, g-4, h-3, i-1, j-2.
Exercício 3: interpretação de texto

Responda às seguintes questões:

1) O que se pretende ao dizer que na teoria dos atos de fala "o uso da linguagem tem precedência sobre a semântica"?

2) Qual a nova tarefa da filosofia dentro da teoria dos atos de fala?

3) O que diferencia a investigação filosófica de outras ciências da linguagem?

4) Que tipo contribuições a investigação filosófica sobre a linguagem pode oferecer?

Interdisciplinaridade: Convide o professor de Sociologia para apresentar a teoria da ação social de Max Weber, depois promova um debate com os alunos, discutindo sobre em que casos um ato de fala poderia ser considerado uma ação social.


Filosofia da linguagem (6)

Austin e Searle e os atos de fala

Costuma-se dizer que "quem fala demais não faz", ou que se deve "falar menos e agir mais". Tais provérbios indicam uma quase oposição entre o agir e o falar. Mas você ficaria surpreso se alguém lhe dissesse que é possível agir através de palavras? Ou que, em alguns casos, podem-se fazer coisas através da fala? Pois é justamente disso que trata a teoria dos atos de fala.
Atos de fala
A teoria dos atos de fala foi elaborada inicialmente por John L. Austin (1911-1960) e desenvolvida posteriormente por J.R. Searle. Austin parte da teoria pragmática de Wittgenstein de que é o uso das palavras em diferentes interações lingüísticas que determina o seu sentido. Esse sentido, porém, não se reduz apenas ao das proposições declarativas do tipo: "a parede é azul".

Vimos com Wittgenstein que, dependendo do jogo de linguagem, o sentido de uma proposição pode mudar. Por isso, é necessário investigar os diversos tipos de enunciados que, diferentemente do exemplo acima, não são uma mera constatação de coisas.

Ao investigar essa questão, Austin descobre que determinadas sentenças são na verdade ações. Ou melhor, que dizer é fazer, na medida em que, ao proferir algo, estou simultaneamente realizando uma ação. Vários são os tipos de ações que podemos realizar ao dizer algo. Quando, por exemplo, digo "sim" perante um juiz ou padre; ao dizer: "nos encontraremos amanhã pela tarde" para um colega; ou ainda, quando pergunto a um amigo: "você tem dez reais para me emprestar?".

Em cada uma dessas frases é realizada uma ação, embora seu sucesso não dependa apenas do sujeito que as profere, mas de uma série de condições. Por exemplo, a noiva pode dizer "não"; posso, mesmo contra a minha vontade, faltar à reunião; meu amigo pode não ter o dinheiro para me emprestar. Isso, contudo, não significa que o que eu disse é falso, apenas que não teve sucesso, do mesmo modo que ocorre com outras ações, quando, por exemplo, corro para pegar o ônibus, mas chego tarde demais. Tendo sucesso ou não, prometer, pedir, exigir, protestar, jurar etc. já são ações por si mesmas.
Diferentes tipos de atos de fala
Chamamos de ato de fala, portanto, a toda ação que é realizada através do dizer. As ações que se realizam através dos atos de fala podem ser muito diferentes. Daí a necessidade de distinguir as diversas dimensões que um ato de fala possui. Falamos em dimensões porque em uma única locução podemos realizar diferentes atos de fala. Por exemplo, na frase: "o senhor está pisando no meu pé", realizo ao mesmo tempo três atos de fala.

O primeiro deles é o ato locucionário, ou seja, o ato de dizer a frase. O segundo ato é o que Austin chama de ilocucionário, o ato executado na fala, ou seja, ao proferir um ato locucionário. Nesse caso, ao dizer "o senhor está pisando no meu pé" não tive a simples intenção de constatar uma situação, mas a de protestar ou advertir para que a outra pessoa parasse de pisar no meu pé. Por fim, há ainda um terceiro ato, chamado de perlocucionário, que é o de provocar um efeito em outra pessoa através da minha locução, influenciando em seus sentimentos ou pensamentos. Na situação descrita, para que o outro tire o pé de cima do meu.

Temos assim o ato locucionário de dizer algo, o ato ilocucionário que realiza uma ação ao ser dito e o perlocucionário quando há a intenção de provocar nos ouvintes certos efeitos (convencer, levar a uma decisão etc.).

É claro que nem todas as expressões são dotadas dessas três dimensões, pois isso depende da força ilocucionária de um ato de fala. A força ilocucionária é algo bem diferente do significado puro e simples da frase, pois ela está diretamente ligada às interações sociais que se estabelecem entre os falantes, relações que podem ser de autoridade, cooperação etc.
Tipos de expressão
Austin classificou em cinco grupos os tipos de expressões de acordo com a força ilocucionária de cada uma delas. São elas:

1) Expressões veridictivas: que dão um veredicto sobre determinado assunto, podem ser feitas por um juiz, um médico falando sobre uma doença, ou mesmo em situações cotidianas em que sustentamos algo com base em valores ou provas;

2) Expressões exercitivas: consistem em tomar uma decisão a favor ou contra determinado comportamento. Diferenciam-se da situação anterior por não serem apenas juízo, mas decisão. Exemplos: proibir, estimar, confiar, prescrever, conceder, exigir, propor etc.

3) Expressões comissivas: aquelas que comprometem o falante com o cumprimento de algo. Exemplos: jurar, garantir, provar, combinar etc.

4) Expressões conductivas: trata-se de uma reação em relação ao destino ou conduta de outros. Exemplos: felicitar, criticar, saudar, desejar, lamentar, queixar-se etc.

5) Expressões expositivas: sua intenção é tornar claro como a expressão do falante deve ser considerada para permanecer fiel ao seu pensamento. Exemplos: comunicar, relatar, testemunhar, reconhecer, corrigir etc.
Papel da filosofia
Ao apresentar a teoria dos atos de fala, ou de que o uso da linguagem tem precedência sobre a semântica, nos distanciamos das posições essencialistas da filosofia. Por outro lado, parece que a filosofia não tem mais nada a fazer ou que se confundiu com a sociologia ou antropologia.

Segundo Austin, existe um campo de investigação que é próprio da filosofia e que só ela é capaz de realizá-lo. Trata-se da análise da linguagem que parte da linguagem comum, como outras ciências, mas que não permanece na mera superfície dos fenômenos. Interessa à filosofia não o uso que se faz de uma língua nesta ou naquela cultura, mas sim as regras subjacentes às diferentes interações lingüísticas.

Ao contrário do cientista, que busca regularidades empíricas através de entrevistas com os usuários de uma determinada língua, o filósofo realiza um saber reconstrutivo da língua como um sistema de ação regrada. Ou seja, interessa à filosofia quais as condições de possibilidade de funcionamento de uma linguagem. Por exemplo: o que torna possível um ato de fala?

A filosofia não busca meramente apresentar os fenômenos, mas entender as condições de possibilidade e de validade em que eles se realizam. Dizer, por exemplo, que o sentido de uma locução é dependente do contexto, não explica como é possível traduzir uma expressão de uma língua para outra. A tradução mostra justamente que é possível passar de um jogo de linguagem para outro, o que colocaria a questão: será que além dos contextos específicos em que se realiza uma fala, não existem determinadas regras ou condições que são independentes do contexto? Ou ainda: existem regras comuns a qualquer jogo de linguagem (por exemplo, seguir regras)?

Austin não chegou a investigar sobre a possibilidade de fazer uma crítica da linguagem a partir de princípios normativos, isto é, a partir de uma "metarregra" ou "metalinguagem" capaz de oferecer critérios para avaliar a linguagem comum, mas abriu o caminho para uma nova geração de filósofos contemporâneos, como John Searle, Jürgen Habermas e Karl-Otto Apel, entre outros.

Aulas Filosofia

Profª Margarida Jansen Plano de Aula Ensino Médio

Filosofia

Cogito, ergo sum

Objetivos

1) Possibilitar uma aproximação com a máxima de René Descartes cogito, ergo sum (Penso, logo existo) ou, mais simplesmente, com o conceito de cogito.

2) Reconhecer a importância fundamental que esse conceito ganhou na teoria do conhecimento e, por extensão, na história da filosofia.

Ponto de partida

O primeiro passo é tornar-se familiarizado com a expressão cartesiana e com seu significado corrente. Para isso, vale uma consulta a um dicionário de filosofia ou a um dicionário da língua portuguesa, como o Dicionário Houaiss.

Num segundo momento, será importante a leitura do "Discurso do método", especialmente do livro 4. A edição da Escala Educacional, com tradução de Ciro Mioranza, de 2006, traz um suplemento de atividades elucidativo. Um texto sobre Descartes e sobre o cogito pode ser encontrado no texto Um personagem para demonstrar a autonomia do pensamento.

Estratégia

1) Discutir o que cada estudante entende pela expressão Cogito, ergo sum ou, mais simplesmente, cogito.

2) Comparar os sentidos que o senso comum atribui a essa expressão e contextualizar o conceito no cartesianismo e na história da filosofia.

3) Localizar e fazer a leitura do trecho do "Discurso do Método" (4) ou das "Meditações" (12, 6), em que o conceito do cogito aparece em seu contexto filosófico, como decorrência de um percurso do pensamento.

4) Comparar os sentidos que o senso comum atribui à expressão cogito, ergo sum com aquele que se depreende da leitura sistemática do texto cartesiano.

Atividade

Os alunos podem elaborar um pequeno folheto didático de filosofia, transcrevendo as informações de várias fontes sobre o significado do cogito, bem como transcrevendo os trechos principais em que esse termo ocorre na obra cartesiana. Os textos podem ser acompanhados de um pequeno comentário.

Caso outras atividades do mesmo gênero sejam realizadas, os folhetos respectivos podem ser aglutinados num pequeno compêndio de filosofia para iniciantes.


Profª Margarida Jansen Plano de Aula Ensino Médio

Filosofia

René Descartes

Descartes e o gênio maligno

Quando o filósofo francês René Descartes escreveu as suas "Meditações", em 1641, deparou-se com um problema técnico. Tinha que mostrar ao leitor, ou melhor, provar, a dificuldade que nós temos em confiar nas percepções dos sentidos para conhecer as coisas.

A percepção (o conhecimento que nos vem dos órgãos dos sentidos) é falha. Quando penso que alguma coisa é real, eu posso estar apenas sonhando, tendo uma visão, posso estar com febre ou mesmo estar mergulhado na loucura.

Mas mesmo assim, pensou Descartes, mesmo tendo alucinações ou sonhando, pode ser que eu considere que alguma coisa que percebo pela visão ou pelo tato ou pela audição ainda assim derive de algo real.

Foi aí que Descartes introduziu na sua obra uma idéia tentadora e interessante.

E se existisse um gênio maligno, uma entidade do mal, disposta a me enganar todo o tempo?

A conclusão do filósofo foi imediata. Mesmo que esse gênio usasse toda sua indústria para nos passar a perna e nos fazer pensar que o que existe não existe e vice-versa, mesmo assim alguma coisa de real nos restaria. E essa coisa - a descoberta fundamental de Descartes - é o cogito: nossa capacidade de pensar.

Ainda que eu estivesse redondamente enganado, ainda assim eu seria essa coisa que pensa, essa coisa muito real que imagina, que sonha, que vê e que se engana redondamente. Mesmo que tudo seja falso, a existência de algo que pensa, que duvida, que se engana, é verdadeira.

Sujeito e objeto

Descartes concluiu assim que aquilo que pensa (o sujeito) é alguma coisa diferente daquilo que é pensado (o objeto). O raciocínio de Descartes, ao mostrar a autonomia do pensamento, permitiu o desenvolvimento de toda a filosofia que lhe sucedeu. A filosofia cartesiana é chamada de racionalismo e essa separação entre sujeito e objeto do pensamento deu origem ao que chamamos de filosofia moderna.

Vamos ver agora como o próprio filósofo apresentou seu gênio maligno?

“Suporei, pois, que há não um verdadeiro Deus, que é a soberana fonte da verdade, mas certo gênio maligno, não menos ardiloso e enganador do que poderoso, que empregou toda a sua indústria em enganar-me. Pensarei que o céu, o ar, a terra, as cores, as figuras, os sons e todas as coisas exteriores que vemos são apenas ilusões e enganos de que ele se serve para surpreender minha credulidade. Considerar-me-ei a mim mesmo absolutamente desprovido de mãos, de olhos, de carne, de sangue, desprovido de quaisquer sentidos, mas dotado da falsa crença de ter todas essas coisas. Permanecerei obstinadamente apegado a esse pensamento; e se, por esse meio, não está em meu poder chegar ao conhecimento de qualquer verdade, ao menos está ao meu alcance suspender meu juízo. Eis por que cuidarei zelosamente de não receber em minha crença nenhuma falsidade, e prepararei tão bem meu espírito a todos os ardis desse grande enganador que, por poderoso e ardiloso que seja, nunca poderá impor-me algo.”

Profª Margarida Jansen Plano de Aula Ensino Médio

Filosofia

Sobre o sentido da vida

Objetivos

1) Discutir o sentido da vida e introduzir alguns conceitos heideggerianos como angústia, morte, ser próprio e ser impróprio;

2) Trabalhar as habilidades cognitivas de interpretação e formação de conceitos.

Atividades

1) O sentido da vida é um tema que cativa à atenção dos adolescentes por eles próprios estarem na busca de referências que os ajudem em seu processo identitário. Para facilitar a introdução do tema, sugerimos o trabalho com imagens ou músicas. Por exemplo, pode-se distribuir a letra de músicas aos alunos para que encontrem nelas o sentido que o autor atribui à existência.

A música Tocando em Frente,de Almir Sater e Renato Teixeira, pode servir de tema para discutir o sentido da vida e esta análise pode ser confrontada com o sentido (ou falta de sentido) contido na música Cotidiano de Chico Buarque.

Outra alternativa é escolher a definição de vida com a qual os alunos mais se identificam na música O que é, o que é? , de Gonzaguinha. Todas as letras podem ser obtidas no site Vagalume).

Em seguida, os alunos devem confrontar suas impressões pessoais com a dos colegas. O professor pode registrar as diferentes definições no quadro. Caso a discussão seja muito produtiva, o professor pode prolongá-la através de um plano de discussão com questões dirigidas à classe, tais como: a) Você acha que existe algum propósito na vida?

b) Viver faz realmente algum sentido?

c) O sentido de nossa vida é diferente do de outros seres vivos? Por quê?

d) Você acha que todas as pessoas se preocupam com o sentido de suas vidas? Você se preocupa?

e Você acha que existiriam boas razões para se buscar um sentido para vida? Quais?

2) Depois das etapas de motivação e discussão com os alunos, pode-se passar para a leitura do texto Filosofia da Existência, do Educação. Peça aos alunos para grifarem quais os conceitos mais importantes que aparecem no texto. Feito isso, deverão procurar no próprio texto definições para os conceitos. Esse trabalho pode ser feito em duplas e empregado para verificar a habilidade de formação de conceitos. A seguir, a sugestão é perguntar aos alunos como interpretaram o texto. Nesse momento, o professor pode retomar algumas idéias para ajudá-los na compreensão dos aspectos principais.

3) Como fechamento, pode-se confrontar as idéias do texto com as definições que foram registradas no quadro. O professor deve quetionar sobre o que o texto os fez pensar ou se eles mudaram a opinião que tinham sobre o sentido da vida antes e depois da discussão do tema em classe.


Cotidiano

Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã
 
Todo dia ela diz que é pra eu me cuidar
E essas coisas que diz toda mulher
Diz que está me esperando pro jantar
E me beija com a boca de café
 
Todo dia eu só penso em poder parar
Meio dia eu só penso em dizer não
Depois penso na vida pra levar
E me calo com a boca de feijão
 
Seis da tarde como era de se esperar
Ela pega e me espera no portão
Diz que está muito louca pra beijar
E me beija com a boca de paixão
 
Toda noite ela diz pra eu não me afastar
Meia-noite ela jura eterno amor
E me aperta pra eu quase sufocar
E me morde com a boca de pavor
 
Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã

Tocando em Frente

Ando devagar porque já tive pressa 
E levo esse sorriso porque já chorei demais 
Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe 
Só levo a certeza de que muito pouco eu sei
Ou nada sei 
 
Conhecer as manhas e as manhãs, 
O sabor das massas e das maçãs, 
É preciso amor pra poder pulsar, 
É preciso paz pra poder sorrir, 
É preciso a chuva para florir
 
Penso que cumprir a vida seja simplesmente 
Compreender a marcha e ir tocando em frente 
Como um velho boiadeiro levando a boiada
Eu vou tocando dias pela longa estrada eu vou
Estrada eu sou 
 
Conhecer as manhas e as manhãs, 
O sabor das massas e das maçãs, 
É preciso amor pra poder pulsar, 
É preciso paz pra poder sorrir, 
É preciso a chuva para florir
 
Todo mundo ama um dia todo mundo chora, 
Um dia a gente chega, no outro vai embora 
Cada um de nós compõe a sua história
Cada ser em si carrega o dom de ser capaz 
E ser feliz 
 
Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar,
É preciso paz pra poder sorrir, 
É preciso a chuva para florir
 
Ando devagar porque já tive pressa 
E levo esse sorriso porque já chorei demais 
Cada um de nós compõe a sua história, 
Cada ser em si carrega o dom de ser capaz
E ser feliz
 
Conhecer as manhas e as manhãs, 
O sabor das massas e das maçãs, 
É preciso amor pra poder pulsar, 
É preciso paz pra poder sorrir, 
É preciso a chuva para florir

O que é o que é

Eu fico com a pureza das respostas das crianças:
É a vida! É bonita e é bonita!
Viver e não ter a vergonha de ser feliz,
Cantar, e cantar, e cantar,
A beleza de ser um eterno aprendiz.
Ah, meu Deus! Eu sei
Que a vida devia ser bem melhor e será,
Mas isso não impede que eu repita:
É bonita, é bonita e é bonita!
E a vida? E a vida o que é, diga lá, meu irmão?
Ela é a batida de um coração?
Ela é uma doce ilusão?
Mas e a vida? Ela é maravilha ou é sofrimento?
Ela é alegria ou lamento?
O que é? O que é, meu irmão?
Há quem fale que a vida da gente é um nada no mundo,
É uma gota, é um tempo
Que nem dá um segundo,
Há quem fale que é um divino mistério profundo,
É o sopro do criador numa atitude repleta de amor.
Você diz que é luta e prazer,
Ele diz que a vida é viver,
Ela diz que melhor é morrer
Pois amada não é, e o verbo é sofrer.
Eu só sei que confio na moça
E na moça eu ponho a força da fé,
Somos nós que fazemos a vida
Como der, ou puder, ou quiser,
Sempre desejada por mais que esteja errada,
Ninguém quer a morte, só saúde e sorte,
E a pergunta roda, e a cabeça agita.
Fico com a pureza das respostas das crianças:
É a vida! É bonita e é bonita!
É a vida! É bonita e é bonita!